sexta-feira, 22 de abril de 2011

Dor

Contos da Nanie é uma coluna do blog Nanie's World! Sempre que a Nanie tiver contos novos, irá postá-los nessa coluna, que sairá às sextas-feiras!
Sua opinião é muito importante! Diga o que você achou das histórias, sua opinião é muito importante para mim!
A culpa dessa coluna existir no blog é da @vanbosso que insistiu muito para que eu postasse os meus contos!
Dor


Era noite novamente. Por que as noites eram mais difíceis, Márcia não sabia explicar. Apenas sentia. A dor era mais forte.
Podia ouvir o vento - batia forte nas folhas das árvores, fazendo um barulho assustador. Sentia-se quase em um filme de terror. Na verdade, ela queria sentir-se em um filme de terror - ansiava pela existência de zumbis ou até mesmo fantasmas. Seria melhor.
Estava muito frio, mas ela parecia não sentir ou não se importa, mais provável que fosse a segunda opção. Usava apenas um leve vestido - florido, com alças fininhas e um aberto em V nas costas. Poderia estar bela, em outras ocasiões, usando essa mesma vestimenta, estivera maravilhosa. Mas agora não era o caso. O vestido estava sujo, amarrotado. As mãos de Márcia estavam sujar de terra - as unhas quebradas, ensanguentadas. Um pouco de sangue também manchava a fita que envolvia a cintura dela. Arranhões em seus braços denunciavam de onde tinha vindo aquele sangue. Os cabelos estavam embaraçados, embolados, sujos e fedorentos.
Márcia não tinha noção do tempo.
Havia lutado arduamente, tentado seguir em frente de todas as formas, agora, entretanto, era hora de desistir.
Dois longos anos. O tempo não era capaz de curar tudo. Se dois anos não eram tempo suficiente, ela não poderia esperar mais. Não tinha força. Nem vontade.
Já vivera dias felizes. Ao lado de Deivid e Lucas se considerava a mulher mais feliz do mundo. Quando Deivid se foi, parte dela morreu junto. O marido, que sempre amara, havia morrido de câncer. Foram três anos de lutas, momentos de felicidade e de desespero que se mesclavam como se isso pudesse ser normal. Mas ela agradecia cada dia que o marido havia resistido, valera a pena cada minuto extra de felicidade que a pequena família havia vivido. No final, também agradecia pela partida do marido, nos últimos dias ele sofria demais. E era penoso para Márcia ver o homem de sua vida tão mal.
Entretanto, Lucas estava ao seu lado. Ela superou e viveu. Pouco mais de um ano havia passado - a dor ainda estava presente - quando veio o que lhe sugou a alma - a doença do filho de sete anos. O menino brincalhão definhou como uma flor deixada fora do vaso. Não foi como a doença do pai, não havia momentos de felicidade, apenas tristeza e muita dor. Lucas morreu menos de seis meses após o diagnóstico. E Márcia morreu junto. Não fisicamente. O restante da família, amigos, todos tentaram ajudá-la a continuar em frente. Ela não existia mais, porém tentou seguir em frente.
Arrumou um emprego, trabalhou bastante. Não quis mudar de casa - fez de tudo para continuar onde ainda tinha algumas lembranças das pessoas que mais amara em todo o mundo.
Por dois anos ela lutou contra si mesma. Durante o dia, no trabalho, com amigos, era fácil fingir - fácil esconder. Ela parecia feliz, às vezes, até conseguia se sentir feliz. Quando chegava em casa, entretanto, as coisas começavam a mudar. A noite era sempre o momento mais difícil. Não conseguia entender o que havia na noite. O que será que vinha junto com a escuridão que era responsável por todos aqueles sentimentos mórbidos? Por toda aquela tristeza que parecia nem existir durante o dia? Ela não tinha resposta, não queria ter.
Havia perdido a noção do tempo. Os amigos e parentes pensavam que estava viajando - um trabalho que já estava agendado há algum tempo. Márcia havia decidido não ir - há três dias não tomava banho, não comia... só chorava. Estava fraca, triste, suja.
No jardim de sua casa - uma granja distante da cidade, onde havia vivido desde o casamento - ela chorava sem parar. Cortou-se com as unhas - a dor física estancava as lágrimas por alguns momentos. A dor de verdade, por outro lado, não passava. Nada seria capaz de apagar aquela dor.
Ela já havia morrido, a primeira parte com o marido, o restante com o pequeno e amado Lucas. A noite tinha razão, Márcia precisava daquilo.
Foi encontrada três dias depois - quando os parentes, com a falta de notícias, foram atrás dela na granja. Estava deitada em uma poça de sangue - um cheiro desagradável já saía de seu corpo. Ao lado um revólver, na cabeça um único tiro. A irmã chorou muito. Não sabia de onde tinha saído aquela arma. Desconhecia que Márcia estivesse tão desesperada.

10 comentários:

  1. Oi Nanie, bom dia.
    Dificil imaginar a dor da Márcia.
    Só de ler já fiquei angustiada.
    acredito que só quem tem muita fé consegue passar por uma tragedia dessas e sobreviver,mesmo aos pedaços.
    um beijo para voce.

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  2. ADOREI esse conto! E olha que sou muito cri cri para avaliar textos e de todos que vc já postou esse foi o mais perfeito! Sério, não estou exagerando. Achei muito bem escrito e mais profundo, talvez por tratar de um tema mais real.
    Foi bem triste também :-(

    Parabéns, Nanie!

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  3. Nossa, estou muito deprimida hoje para esse tipo de conto. É muito bom, eu que não estou num bom momento.
    Bjkas,

    Monique

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  4. Aff... realmente é muita dor para uma pessoa só...no final a morte parece bem convidativa...
    Parabens pelo conto Nanie!!
    adorei como sempre..
    bj

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  5. Humm, que conto triste. O título expressa bem. Mas é um conto muito bem escrito. Parabéns!

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  6. ESSE É DE LONGE O SEU MELHOR CONTO, PARABÉNS NANIE, VOCÊ TEM TALENTO!

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  7. Adorei o conto... profundo, doloroso e extremamente humano.

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  8. Muito, muito triste, Nanie. =(
    Mas bem escrito, claro.

    Bjs
    Tah

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  9. Todos seus contos que já vi são ótimos Nanie, mas esse tem algo de diferente. Muito bom!
    E triste também, com um final trágico.

    Bjus.

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  10. Esse conto mexe com a alma e com o coração...Acredita que sofri junto? quando leio coisas desse tipo me ponho no lugar do personagem e é díficil segurar...acho que eu faria o mesmo...
    Parabéns Nanie!!! Seus contos são ótimos.
    Bjos!!!
    Andréia
    Sentimento nos Livros

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